Projeto Lerelena

Projeto Lerelena

Em homenagem ao centenário do nascimento da poeta paranaense Helena Kolody iniciamos o Projeto Lerelena.

Nove poetisas do sul brasileiro se propoem ao desafio de ler relendo (ler helena) e interInvencionar. A proposta é confluir e colidir a nossa letra com a dela, helena. As interInvenções serão sempre sensibilizadas por poemas seus. Nesta primeira etapa partiremos de nove poemas que serão postados a cada sexta-feira.


Miragem no caminho (Helena Kolody)

Perdeu-se em nada,

caminhou sozinho,
a perseguir um grande sonho louco.

(E a felicidade
era aquele pouco
que desprezou ao longo do caminho.)



domingo, 15 de julho de 2012

o que resta entre a fresta do lençol e a colcha


12-12-11

Se eu não escrever eu morro. É uma coisa muito grande que sai de dentro, na verdade não sai fica, fica, fica..... Eu não sei quem sou, sou.... A coisa é grande e não sai de dentro, fica, fica, fica.... Não sei se vou conseguir tirar isso daqui sozinha, na verdade sei que não, mas desejo que sim.... O que desejo, também não sei, só sei que é grande.... bem grande e não sai daqui.... A primeira ação é tentar pensar em mim, pensar e não tentar... O que é que eu quero, como eu me sinto, não isso não, eu não posso mais pensar como me sinto, isso já penso demais da conta. A primeira ação é pensar em mim, o que eu posso fazer por mim mesma.... não é lavar, cuidar da casa, cozinhar.... é dançar, ler, ver filmes, aprender a costurar, aprender a pintar, a criar, a escrever, é isso, eu tenho que ser autônoma, não sei se isso é uma coisa que colocaram em mim, mas é assim que sinto.  

Pensar em compartilhar, pensar em ser dois é se frustrar, pois o tamanho que um quer ser dois o outro quer ser um mais um, um mais um não é a mesma coisa que dois. 

Dois é dois, se a gente tem dois pés a gente até anda com um só, mas sente falta e logo usa o outro também, como vou ligar um aparelho na tomada só com um buraco, o buraco até admite três, mas um, nunca. O que eu quero... será mesmo que quero o dois... talvez isso seja só enganação de alguém que não quer admitir sua solidão, seu número um, afinal um é sempre um. Eu quero ser um.... eu sou um..... Será?  

Esse foi o ano mais longo de um ano que passei. Tudo foi sentido com dor, e a dor de um é muito maior que a dor de dois. E o dois não pode sentir a dor sem ler-la. A palavra é a dor dos dois. Como aceitar a cegueira do dois, se é só o sentido que sente a palavra. O problema é que um não é som, nem cheiro, um é palavra e se palavra não é tocada pela pele ela queima dentro do eu, um. Queima, queima, queima, queima, e nada que um possa fazer vai tocar um dois cego de sua maior dor, por sua dor, cego pela palavra. 

Se eu não escrever eu morro, mas porque eu não escrevo e esqueço um dois que não vê? Isso é uma tortura, e dois parece sentir o mesmo, ou pelo menos alguma coisa que se pareça com dor, acho que não, mais leve, bem mais leve.... O que dois não entende é que um não sobrevive de brisa, um sobrevive da palavra, mas sempre da palavra de dois, dois e um.... Não um, você tem que saber sobreviver de sua própria palavra e essa tem que ser sua coisa, sua coisa, sua coisa, sua coisa, sua coisa.... Um não consegue ter sua coisa, talvez porque sempre foi dois e dois é diferente de um mais um. E toda vez que um foi um mais um, um procurou outro um pra formar dois.... 

E o pior de tudo é não poder dividir a dor na mesma cama. A dor é repartida na mesma cama, mas não dividida, e o outro não vai ler essas palavras, pois elas carregam uma força sangue que dois nunca vai deixar de ler ao ver .... 

então não sei o que resta entre a fresta do lençol e a colcha... Um não mora mais ali, um sobrevive ao dia claro. Um sobrevive com menos peso quando um escreve. Será?

Um comentário:

Unknown disse...

8
saudade tem que ser igual a bumerangue
e ser doadora de sangue
porque
saudade sem resposta
é eco que não volta
porque
uma saudade sozinha
é uma saudade doente
de doença do ente

a saudadescreve
e a tinta mancha
e a tinta é quente
a saudadescreve
como quem faz diálise